sexta-feira, 10 de setembro de 2010

Crianças-Espetáculo?


Tem certas coisas que eu não entendo. Os canais a cabo infantis no Brasil terem publicidade, por exemplo. Já não basta o que ganham com licenciamentos?
Me pergunto que tipo de pessoinhas andamos criando com a babá eletrônica... Pelo que vi, só crianças com ânsia de virar celebridade.
Propaganda de marca de roupa infantil? Meninas com microfone dançando em cima do palco. Desfile de moda com modelos mirins. Promoção do canal gringo? Menina usando escova como microfone, cantando e dançando em cima da cama e sonhando ganhar um concurso de apresentadora para terminar um dia... em cima de um palco.
Isso significa que não estar em cima do palco (ou ser popular) é ser otário? Que profissões normais não valem a pena?
Nesse novo mundo imagético, criança não fica triste. Vive num supostamente alegre e perene frenesi.
Lembro quando eu era criança. Eu podia ver toda a televisão que eu queria. Mas eu detestava. Meus pais se mudaram para o Brasil quando eu tinha cinco anos.
Eles trabalhavam muito, chegavam tarde, e eu ficava basicamente sozinha, com a tevê ligada. A noite chegava, as novelas começavam, e meu pânico de meus pais nunca mais voltarem para casa se renovava. O que eu faria se eles não voltassem? Eu já não os tinha , e meus avós, meus tios, minhas queridas primas, todos tinham ficado para trás, arrancados de mim pela distância.
Meus pais devem ter deixado alguém pra cuidar de mim, alguma empregada, mas sinceramente não lembro. Lembro só da tevê, da entediante propaganda eleitoral gratuita, com os candidatos exibindo aquelas fotos horrendas em preto e branco. Era o final da década de 70. Lembro de ir para a sala com uma minicanequinha de cerveja bege, daquelas que distribuem na Oktoberfest. Lá dentro havia várias pulseirinhas com bolinhas coloridas entremeadas por uma correntinha dourada.
Era moda usá-las todas juntas, cada uma de uma cor, em uma das mãos. E eu ficava olhando para a tevê e para as pulseiras, por horas. Verde, vermelha, azul. O cheiro da corrente de metal barato da pulseira, que ao roçar os dedos, contaminava a mão. Horas que não passavam.
Aquela tela ligada de onde saíam palavras estranhas, testemunhas da minha enorme, catastrófica, solidão.
Naquela época não tinha propaganda de meninas com menos de dez anos dançando em cima dos palcos, sendo lindas, e famosas e felizes. Pelo menos dessa pressão horrível eu escapei. E a minha filha, escapará?


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